A CCI realizou recentemente uma série de intervenções públicas no Brasil, as quais relatamos neste artigo. Foram três reuniões públicas sucessivas em três cidades diferentes (Salvador e Vitória da Conquista, na Bahia, e São Paulo) e uma apresentação seguida de um debate na Universidade Estadual do Sudoeste do Estado da Bahia, na cidade de Vitória da Conquista, por ocasião do "IIº encontro de estudantes de história do Estado de Bahia" (o tema do encontro era "as lutas sociais e suas expressões na história").
O tema das reuniões públicas era "Diante da crise mortal do capitalismo, o futuro pertence à luta de classes" e o da apresentação na universidade, "As origens e as características essenciais da Esquerda comunista internacional".
Esta intervenção no Brasil foi uma estréia para a CCI, e só foi possível graças às iniciativas de nossos simpatizantes nesse país e à colaboração com um grupo proletário brasileiro chamado "Oposição Operária"[1] [1], o qual se encarregou de organizar as reuniões públicas.
Para esta primeira intervenção pública no Brasil, a CCI escolheu temas que lhe permitissem expressar o melhor possível sua visão histórica sobre a possibilidade e a necessidade da revolução proletária. Por isso, a exposição comum das três reuniões públicas, que pode consultar-se em nossa página Web em português, desenvolvia os aspectos seguintes:
1. Igualmente aos sistemas de exploração que o precederam, o capitalismo não é um sistema eterno;
2. A hora de sua derrubada pelo proletariado, única classe revolucionária da sociedade, já soou há muito tempo. Se o proletariado não for capaz de cumprir com sua tarefa histórica, a situação atual levaria ao fim da humanidade;
3. As perspectivas contidas na situação atual se definem pelo desenvolvimento da luta de classes.
Em uma dessas reuniões públicas, a de Salvador, em seguida depois da apresentação da CCI, como estava previsto aconteceu a apresentação da Oposição Operária que pôs destaque, em particular, o papel fundamental da organização da classe operária em conselhos operários para a derrubada do capitalismo.
A apresentação na Universidade, por sua parte, apoiou-se essencialmente no artigo de nossa página Web, "a Esquerda comunista e a tradição marxista", e tinha os eixos seguintes:
1. O que distingue às frações de esquerda das demais organizações que se reivindicam do marxismo;
2. A esquerda comunista não era uma corrente única mas compreendia diversas expressões todas correspondendo ao esforço histórico da classe operária para o esclarecimento político ;
3. A contribuição da Esquerda comunista no desenvolvimento do patrimônio político-teórico do proletariado é muito importante e insubstituível.
Para dar conta desses quatro eventos, pareceu-nos melhor não tratá-los separadamente, mas referir as questões e preocupações que majoritariamente se expressaram e deram lugar ao debate. Mas antes acreditamos que é essencial fazer ressaltar a importância dessas reuniões tanto por sua assistência numerosa (muito numerosa às vezes) como pelo caráter participativo e vivo dos debates que se estenderam além do tempo previsto até o horário que as circunstâncias locais o permitiram.
[1] [2] Este grupo com o qual a CCI esta estabelecendo uma relação de discussão e colaboração políticas pertence claramente ao campo proletário por conta em particular de seu envolvimento no combate internacionalista para a victória do comunismo. Por outro lado, ele demostra uma clareza significativa considerando a natureza dos sindicatos e a mistificação democrática e eletoralista. Para consultar sua página web : opop.sites.uol.com.br [3] .
Ocorre às vezes que os próprios revolucionários fiquem surpresos com o grande interesse que suas posições despertam em um dado momento, embora constituam a parte do proletariado em que existe a maior confiança nas capacidades revolucionárias de sua classe, inclusive quando esta não está envolvida de maneira imediata em preocupações revolucionárias explícitas. Temos que reconhecer que ficamos agradavelmente surpresos com a ampla participação nestas reuniões, ao haver-se superado em algumas delas a presença que estamos acostumados a assistir em reuniões públicas nas cidades onde a CCI intervém regularmente. Cerca de cem pessoas participaram ao total das três reuniões públicas. E à exposição sobre a Esquerda comunista em um teatro da Universidade compareceram 260 pessoas, durante toda a primeira parte do debate. A reunião se prolongou durante duas horas além do previsto, chegando ao final com 80 pessoas presentes, e sem que todas as perguntas pudessem ser respondidas.
Há uma série de circunstâncias favoráveis que explicam essa presença. A primeira aparição pública de uma organização revolucionária internacional desconhecida no Brasil é algo que evidentemente pode explicar o interesse despertado localmente por ela. Além disso, as reuniões públicas se beneficiaram de uma propaganda eficaz da que se encarregou Oposição Operária, só ou com nossos simpatizantes. Embora também possa mencionar o interesse acadêmico e não só político que tenha animado alguns estudantes e professores a participar do debate sobre a história da Esquerda Comunista, terá que tomar em consideração que o que se anunciou no início, por causa do regulamento interno da Universidade, como a exposição de um historiador[1] [4], acabou tendo a forma de um comício político coordenado por um organizador da jornada, pela Oposição Operária e a CCI; além disso havia uma mesa com publicações da CCI na entrada do teatro.
Na realidade, o êxito de nossas reuniões resulta em grande parte de que no Brasil existe uma atenção apurada para uma crítica radical da sociedade e das instituições democráticas, pois à cabeça dessas instituições está o governo de Lula, o grande "líder operário" de esquerda cujo nome está indissoluvelmente vinculados aos do PT (Partido dos Trabalhadores, surgido em 1980) e da CUT (Central Única dos Trabalhadores, 1a. Central Sindical "independente" criada no final da ditadura, em 1983). Hoje a aliança Governo, Lula, PT e CUT deve assumir abertamente o papel de ponta de lança dos ataques contra a classe operária que exige a defesa do capital nacional brasileiro no campo internacional, como o fariam quaisquer governo e partidos de direita, o que permite que apareça às claras sua verdadeira natureza de inimigos da classe operária que sempre foram. No Brasil, como nos outros países, a resposta da classe operária está muito longe de corresponder a amplitude dos ataques capitalistas que sofre constantemente. Existe também no Brasil, entretanto, e isso é precisamente o que basicamente explica o indubitável interesse por essas reuniões públicas, uma preocupação crescente pelo futuro diante da quebra cada dia mais evidente do capitalismo, o qual se plasma em um incremento do interesse pela perspectiva de uma alternativa à sociedade atual.
As análises da história de nossa classe e as perspectivas de luta política para uma futura sociedade comunista, que nossas exposições e intervenções continham, não foram absolutamente recebidas como dogmas, mas sim suscitaram toda uma série de questionamentos e um entusiasmo, às vezes também ceticismo, e marcas de simpatia que alguns quiseram nos demonstrar no final das reuniões, além de inúmeras questões que não tinham podido colocar por falta de tempo durante a discussão.
A importante participação nessas reuniões pôde nos ter surpreendido um pouco, mas sobre tudo confirmou a tendência cada vez mais forte da juventude em se colocar na primeira fila dos questionamentos políticos diante do futuro. Tanto é, que em uma das reuniões públicas, na cidade de Vitória da Conquista, mais da metade da assistência eram jovens quando não, muito jovens.[1] [4] O objetivo militante estava entretanto claramente presente desde o início no segundo título de nossa apresentação "o futuro pertence à luta de classe".
Trazemos aqui as principais questões que nos foram expostas e as respostas que demos. Freqüentemente as perguntas e nossas respostas foram parecidas entre uma e outra reunião, sem por isso serem idênticas. Melhor que sintetizar as perguntas por temas, optamos por escolher uma pergunta representativa por tema, para refletir o aspecto dinâmico das discussões. Considerando as nossas respostas, resenhamo-las com o essencial dos argumentos que desenvolvemos no conjunto das reuniões.
Somos muito conscientes de que esta narração, já extensa, deixará de lado algumas questões importantes e muito interessantes. Para remediar em parte esse inconveniente, encorajamos todos aqueles que tiverem conhecimento desta narração que não hesitem em nos dizer por escrito todas as questões e desacordos que não tenham obtido uma resposta satisfatória de nossa parte. Daremos respostas individuais que, com seu acordo, poderão eventualmente servir para animar um debate público na imprensa da CCI ou na Internet. Também animamos aos leitores desta resenha a que façam o mesmo a respeito da Oposição Operária que responderá também. Sobre isso, queremos precisar que algumas respostas aqui resenhadas não foram dadas por nós mas sim por Oposição Operária. Mas como correspondiam perfeitamente ao que teríamos dito, nós as assumimos como nossas. O que não significa que todas as respostas dadas por uma ou por outra de nossas organizações fossem compartilhadas por ambas."Como explicar o papel atual dos sindicatos? Enquanto que sim houve uma época em que eram verdadeiras ferramentas da luta da classe operária, hoje estão claramente a serviço dos interesses da classe burguesa, paralisando as reações operárias diante dos ataques. "
Não existe em efeito nem um só país onde os sindicatos, todos os sindicatos, não sejam defensores da ordem burguesa. Se é assim é porque, por toda parte, converteram-se em órgãos do estado burguês cuja função específica é enquadrar a classe operária para sabotar suas respostas aos ataques e evitar que desemboquem em ações que favoreçam a derrubada do capitalismo em crise.
Para compreender os fatores profundos desta situação, não podemos perder, efetivamente, de vista que no século XIX os operários lutavam por obter o direito a organizar-se em sindicatos. E foi mediante algumas lutas importantes levadas a cabo por seus sindicatos que os operários conseguiram arrancar reformas duradouras que na verdade permitiram melhorar suas condições de vida no capitalismo. De igual modo, inclusive se as idéias reformistas, cuja finalidade era limitar os combates de classe às lutas por reformas unicamente, estavam muito representadas no seio do movimento sindical, isso não pôde impedir que os sindicatos fossem também, naquela época, um lugar privilegiado para a propaganda a favor das idéias revolucionárias, uma "escola de comunismo", como dizia Marx.
"Quando e porque os sindicatos perderam essa natureza operária que lhes era própria?"
No início do século XX se produziu um fato de grande importância, inédito na vida do capitalismo, a eclosão da Primeira guerra mundial. Em um tempo relativamente breve, as contradições do capitalismo engendraram uma destruição considerável de forças produtivas, sem comparação alguma com as conseqüências das guerras e das crises cíclicas que até então tinham prejudicado o crescimento do capitalismo. Essas contradições eram a expressão de que, depois de ter sido fator de progresso da sociedade, o sistema se tornou uma ameaça de morte para ela. Foram o desencadeamento de tal barbárie e a ameaça para a existência mesma da vida da sociedade que constituíram o fermento da primeira onda revolucionária do proletariado mundial.
Diante da irrupção de contradições desconhecidas até então na sociedade burguesa, o Estado adquiriu um papel de uma importância que nunca havia tido até então sob o capitalismo. Ao Estado lhe incumbiu manter submetido o conjunto da sociedade em uma camisa de força para mobilizar e canalizar todos os recursos para a defesa nacional. Nesse processo, os antigos órgãos de luta que eram os sindicatos escapam ao controle dos operários para converter-se em órgãos encarregados de fazer aceitar a militarização do trabalho. Esse processo é irreversível e os sindicatos que, como a CNT espanhola, não se viram submetidos a esse momento da verdade, porque a Espanha não esteve envolta na Iª Guerra mundial, acabaram sendo absorvidos posteriormente pelo Estado. Doravante, os únicos órgãos de massas e unitários de defesa dos interesses da classe operária só poderão surgir e manter-se com a mobilização da classe mediante a luta.
"Acaso não apoiava o próprio Lenin aos sindicatos?"
A vanguarda do proletariado mundial tomou consciência de que com a Iª Guerra mundial e a primeira onda revolucionária tinha nascido a época das "Guerras e as revoluções", como o proclamou a IIIª Internacional, colocando como resultado da luta do proletariado a alternativa seguinte para a sociedade: "Socialismo ou barbárie". A realidade dos fatos impôs essa compreensão. Era, no entanto, necessário poder dispor de uma maior distancia temporal para captar tudo o que essa mudança histórica implicava considerando a vida da sociedade (o desenvolvimento do capitalismo de Estado) e as condições da luta de classes: impossibilidade para a classe operária de seguir utilizando para suas lutas, o Parlamento (cuja única função acabou sendo a da mistificação democrática) e os sindicatos. Entretanto, todas as frações do proletariado mundial não estavam nas mesmas condições quanto a sua própria experiência de enfrentamento com os sindicatos. E nisto, a situação do proletariado russo era específica devido a que nesse país o estado tzarista, totalmente anacrônico era incapaz de levar a cabo uma integração no estado de sindicatos que, por outro lado, eram pouco potentes e tardiamente aparecidos. Desde aí vem a maior dificuldade de Lenin e de seus camaradas para entender plenamente a função desses órgãos na nova fase do capitalismo."Como surgem os Conselhos operários?"
Esta é uma pergunta importante visto que essas palavras de Lênin antes da Revolução de 1917, "… os soviets são a forma por fim descoberta da ditadura do proletariado", não tinham um sentido limitado à primeira onda revolucionária mas sim a uma dimensão universal.
Deste modo, em suas futuras lutas revolucionárias, o proletariado se organizará uma vez mais em "soviets" (palavra russa que significa "conselho"). Estes nasceram pela primeira vez durante a Revolução de 1905 na Rússia. Foram uma criação espontânea da classe operária que assim descobriu por sua própria experiência os meios de luta que precisa para desenvolver suas lutas em condições novas.
Qual era então sua função? A classe operária na Rússia tinha diante dela o poder do Estado recusando-se intransigentemente e apesar do desenvolvimento da mobilização, em ceder às reivindicações dos operários. Essa situação prefigura a situação geral do capitalismo em sua fase de decadência em que as contradições crescentes que deve confrontar não só o impedem conceder reformas duradouras à classe operária, como era no período ascendente, mas o obrigam a atacar permanentemente as condições de vida dos operários. Nessas condições, a mesma dinâmica da luta conduz aos operários a opor-se ao Estado capitalista e a enfrentá-lo de forma sempre mais maciça. Por isso a luta alcança espontaneamente uma dimensão política que se sobrepõe à dimensão econômica ainda presente.
Os sindicatos já não correspondem às necessidades dessa nova forma de luta nem a seus desafios, e são os soviets, capazes de agrupar o conjunto da classe operária, que se impõem. Desde esse momento, os sindicatos já não são órgãos utilizáveis para a luta de classe. Mas longe de definharem-se, os sindicatos foram recuperados pelo Estado. Por outra parte, esse episódio foi o resultado de um longo processo de constituição do proletariado numa classe que adquiriu uma maturidade lhe permitindo de agora em diante construir seus próprios órgãos de luta no fogo da ação; a classe operária deixou de ser dependente para entrar em luta da existência prévia de sindicatos, como foi durante o século XIX.
"Como favorecer o aparecimento dos conselhos operários?"
Os soviets não aparecem a qualquer momento, independentemente do nível da luta de classes. Aparecem quando a classe operária é capaz de colocar o problema do enfrentamento decisivo com o Estado capitalista. São produto de uma formidável mobilização do proletariado, e desaparecem quando esta reflui ou se não são cercados pelo Estado. Isto tem como conseqüência que não há possibilidade para uma minoria da classe mais avançada, estabelecer a estrutura dos soviets com objetivo acelerar a mobilização operária antes que esta se manifeste explicitamente.
Significa isso que fora dos soviets não existe possibilidade para que se expresse a mobilização operária e a luta de classes, visto que os sindicatos já não lhe servem para nada? Claro que não. A experiência viva da luta de classes mostra que uma das formas elementares da mobilização dos operários é a assembléia geral. E não é por acaso se os sindicatos fazem de tudo para que não ocorram as assembléias gerais ou, quando não as podem impedir, para que não cumpram com a função de lugar de organização e de decisão da luta. Com o desenvolvimento da luta aparece a necessidade de sua organização, de sua centralização através da eleição pelas assembléias de delegados revogáveis. Esse modo de organização da classe operária, fora dos períodos pré-revolucionários, prefigura a organização em soviets porém não é seu embrião. Mas ele constitui uma preparação indispensável, no sentido em que através deste tipo de organização,os operários tomam a confiança em si mesmos e em sua capacidade de organizar-se.
Por outro lado, se os acontecimentos de 1905 mostram a capacidade da classe operária de auto-organizar-se e também seu caráter como classe espontaneamente revolucionária, entretanto isso não diminui em nada o papel fundamental da organização dos revolucionários e do partido. A propósito dos acontecimentos de 1905, Rosa Luxemburgo põe em evidência que a intervenção da social-democracia revolucionária tinha participado em preparar o terreno à irrupção da greve de massas. E no mesmo sentido, sem a intervenção em 1917 do Partido bolchevique nos conselhos operários para lutar contra a influência dominante dos partidos ligados à burguesia, esses conselhos não teriam conseguido chegar a ser o instrumento da revolução proletária. Hoje também, é responsabilidade dos revolucionários lembrar a sua classe como esta se organizou em seu passado, pôr em evidência que para desenvolver sua luta não existe outro meio que o de tomar suas lutas em mãos próprias através assembléias gerais soberanas."Como o afirma o historiador francês Jacques Courtois, não acabou a Revolução russa com uma onda democrática mundial?"
Não sabemos exatamente o que disse Jacques Courtois, mas é contrário à realidade afirmar tal coisa quando os principais países do mundo, implicados em uma guerra mundial, estavam adotando medidas de militarização da sociedade civil para impor à população e à classe operária em particular todos os sacrifícios exigidos pela matança mundial, até o de sua vida nos campos de batalha. E foi precisamente contra essa barbárie que se desenvolveu a onda revolucionária mundial cujo ponto culminante foi a tomada do poder pelo proletariado na Rússia em 1917.
Possivelmente Jacques Courtois seja um advogado das teses burguesas do menchevismo segundo as quais a Revolução de Outubro não foi nada mais que um golpe que acabou com a obra democrática da Revolução de fevereiro. Esse famoso refrão bem conhecido dos detratores da Revolução russa também serve a ocultar a realidade dos fatos. Na realidade foram as massas operárias, e atrás delas as massas camponesas, as que tiraram o poder da burguesia quando estava, uma vez chegada ao poder em fevereiro e sendo majoritária nos conselhos operários, demonstrando na prática, ao prosseguir a guerra imperialista e mantendo uma política anti-operária, que era a digna representante de um sistema que teria que ser derrubado, pois só podia produzir guerra e miséria.
"Como explicar a degeneração da Revolução russa?"
É necessário, para entender o que significou a derrota da Revolução russa através sua degeneração, clarificar o que representou realmente essa revolução. Uma ilhota de socialismo em um mundo capitalista? Claro que não, na medida em que a derrubada do capitalismo só pode realizar-se a nível mundial, depois da vitória da revolução mundial. Depois da tomada do poder, todos os esforços e as esperanças do proletariado revolucionário na Rússia estavam dirigidos na direção da extensão da revolução mundial, e particularmente para o país determinante para a evolução da relação de forças entre as classes a escala internacional, Alemanha. O assalto revolucionário do proletariado nesse país foi vencido como é sabido em janeiro de 1919, e esta derrota abriu as portas a uma série de derrotas maiores que acabaram com a grande onda revolucionária nesse país e a escala mundial. Nessas circunstâncias, isolado e debilitado pela guerra civil e pelo cerco imposto pelas principais potencias capitalistas, o poder proletário na Rússia degenerou.
O que mudou com a contra-revolução na Rússia não foram então as relações de produção, é mas o fato que o poder deixou de ser proletário. Não foi a antiga classe burguesa derrubada que voltou ao poder, mas sim a burocracia no seio do Estado que se transformou em nova classe exploradora.
No plano político, a manifestação mais significativa da mudança de caráter do poder na Rússia, encarnado desde então pelo estalinismo, foi o abandono do internacionalismo proletário com a adoção da tese do "socialismo em um só país". O mas dramático da derrota da Revolução russa foi a maneira como se produziu, por uma degeneração interna e não por sua derrubada, permitindo assim à burguesia mundial, de sua ala da extrema direita até sua extrema esquerda, manter a mentira do "socialismo na URSS", mentira em nome do que estalinistas e trotskistas chamaram o proletariado do mundo inteiro a lutar e fazer-se massacrar pela defesa do imperialismo russo durante a Segunda guerra mundial."Qual é sua concepção do papel do partido?"
Compartilhamos com Lênin a concepção de um partido minoritário de vanguarda da classe operária, que tem o papel de participar ativamente na elevação da consciência do conjunto do proletariado. Entretanto, contrariamente ao Lênin (e ao conjunto dos marxistas antes do 17), consideramos que seu papel não é o de tomar o poder em nome da classe operária, tarefa que cabe ao conjunto da classe organizada em conselhos operários. Considerando o modo de organização do partido, reivindicamo-nos no essencial da concepção defendida por Lênin no Congresso de 1903 do Partido Operário Social Democrata da Rússia (POSDR), tal como foi assumida pelos bolcheviques e mais tarde pelo KAPD (Partido comunista operário da Alemanha). Referimo-nos claro à definição feita nesse congresso de quem é um militante qualquer um que se compromete a militar para defender as posturas do partido, contra a visão dos mencheviques para qual bastava partilhar as posturas do partido para ser membro (Lênin escreveu sobre este Congresso seu famoso livro Um passo adiante dois passos para trás). Mas também nos referimos à luta (pelo menos tão importante) levada por Lênin a favor de um comportamento militante animado pelo espírito de partido, contra o espírito de círculo que então dominava o POSDR por causa de suas origens a partir de círculos aparecidos na Rússia e na emigração no fim do século XIX. Em particular, defendemos a idéia de um congresso soberano cujas decisões devem ser aplicadas com disciplina pelo conjunto dos militantes e rejeitamos a posição dos mencheviques que consideravam que cada um podia livrar-se delas quando não concordava.
"Por que não aparece o nome do Gramsci em seu resumo da história da Esquerda comunista internacional?"
Não se trata de um esquecimento, se tivéssemos falado do Gramsci teria sido para defini-lo como um dos representantes, no Partido comunista da Itália, da política cada dia mais oportunista da Internacional comunista (IC). Quando nesse mesmo partido, a Esquerda, encabeçada pelo Bordiga, era amplamente majoritária de 1921 a 1924 frente à tendência de direita animada por Gramsci, este foi colocado autoritariamente pela IC à cabeça do partido para amordaçar a esquerda. A demarcação com respeito ao estalinismo que fez mais tarde, tornou ele numa referência mais respeitável que Stalin, mas nem por isso o tornou num revolucionário."Qual é a significação do programa de transição redigido por Trotski em 1938?"
Trotski e a Oposição de esquerda animaram durante os anos 20 uma reação proletária contra a degeneração da Revolução russa e o estalinismo. Entretanto não foi a única reação, nem tampouco a mais clara considerando por um lado as implicações na classe operária da derrota da onda revolucionária, e por outro lado a fidelidade ao marxismo diante do desenvolvimento do oportunismo nas filas da Terceira internacional. A Esquerda comunista internacional lutou desde o inicio, a partir dos anos 20, contra as diversas manifestações desse oportunismo, em particular contra a política de frente única com antigas partidos operários passados ao campo burguês, com o argumento de não se afastar das massas operárias ainda influenciadas por estes. Também soube entender que longe de estar pronta a lançar-se uma vez mais numa nova onda revolucionária, o proletariado estava confrontado ante um período de contra-revolução que não lhe permitia opor-se ao desencadeamento de uma Segunda guerra mundial em que seus vários setores nacionais foram alistados em nome da defesa de um ou outro campo imperialista. Ao contrário, Trotski continuou acreditando que a revolução continuava sendo possível nos anos trinta e que a única coisa que lhe faltava era uma direção realmente revolucionária, o que lhe induziu sem razão, a ver nas mobilizações de 1936 na França e na Espanha as primícias de movimentos revolucionários. Seu Programa de transição, ao voltar para introduzir reivindicações mínimas destinadas segundo ele a servir da transição com o programa da revolução socialista, acaba enganando as massas com a idéia que poderia existir, na época das guerras e das revoluções, um programa de reformas no capitalismo quando o único programa realista, apesar de não ser realizável em qualquer instante, é o da revolução. Com a bandeira de "Frente única operária" com os partidos antes proletários, social-demócratas e estalinistas que tinham traído a causa do proletariado, ele só faz desarmar a classe operária frente a seus piores inimigos.
"Qual análise faz do trotskismo?"
Existem alguns acontecimentos da maior importância na vida da sociedade, como as guerras e as revoluções, que resolvem na prática o caráter de classe de uma organização, diga o que disser por sua própria conta. Assim ao opor-se à Revolução de outubro, os mencheviques marcaram seu compromisso no terreno da burguesia. Diante da Primeira guerra mundial, a maioria dos partidos social-democratas traiu o internacionalismo proletário (e conseqüentemente a classe operária) ao apoiar a defesa do capital nacional. A história demonstrou que essas traições são irreversíveis, ou seja que uma vez que essas traições aconteçam os partidos passados ao campo inimigo, defendem constantemente uma política burguesa. Como conseqüência de sua degeneração oportunista, os PC se passaram a sua vez ao terreno da burguesia nos anos 30, quando já não existia ninguém em suas filas capaz de opor-se à defesa nacionalista de um campo imperialista, preparando assim o alistamento do proletariado para a Segunda guerra mundial. Esta Segunda guerra mundial também constituiu a hora da verdade para o trotskismo que então escolheu seu campo: não o do internacionalismo e do proletariado como o fez Lênin em 1914, mas sim o da defesa do imperialismo russo e da democracia (apesar de que em suas filas houve reações de elementos que então romperam com ele). Este resultado trágico da dinâmica oportunista de um partido do proletariado foi o produto do método politicamente errôneo de Trotski ao longo dos anos 30. Dito isto, os enganos que cometeu, por graves que fossem, não permitem afirmar que teria mantido sua posição até o final do conflito imperialista mundial. Se não o tivessem assassinado antes, possivelmente a guerra teria sido a prova que lhe tivesse permitido questionar seus desvios oportunistas passadas. Depois da sua morte, sua companheira, Natalia Sedova, que sempre tinha lutado ao seu lado, rechaçou a política de defesa da URSS e rompeu com o movimento trotskista. Também os últimos escritos do Trotski anunciam semelhante possível questionamento de suas posições anteriores."A burguesia conseguia superar as crises cíclicas do capitalismo. Com que mecanismos consegue agora controlar o aprofundamento da sua crise insuperável?"
O capitalismo de Estado é a resposta do capitalismo à irrupção de contradições insuperáveis que o assaltam com a entrada em sua fase de decadência, em três aspectos: o da guerra, o da luta de classes e o da crise. A crise de 1929 impõe à burguesia voltar a implementar as medidas de capitalismo de Estado que tinham sido bastante abandonadas, assim que acabou a Primeira guerra mundial. Essas medidas só fizeram se intensificar ao longo dos anos 30, em particular com as medidas keynesianas de injeção maciça de capital por parte dos Estados nas economias nacionais, medidas que se concretizaram em particular com as grandes obras públicas e com o desenvolvimento da indústria de armamentos em preparação da Segunda guerra mundial. Prosseguiram e se intensificaram ainda mais ao terminar da guerra.
Inclusive antes de que se esgotasse o período de prosperidade que seguiu a Segunda guerra mundial, a burguesia recorreu às políticas de endividamento sempre mais maciço. Assim conseguiu adiar para o futuro a explosão das contradições de sua economia, mas ao preço de agravá-las.
Se entrou o sistema em sua fase de decadência, como explicar o crescimento depois da Segunda guerra mundial? Não terá que datar o início da decadência a partir do esgotamento deste?"
O período de decadência não se manifesta como pensava Trotski no Programa de transição por um bloqueio total de seu crescimento no plano econômico mas sim por uma travagem do desenvolvimento das forças produtivas. Para verificar que a evolução econômica durante a decadência expressa essa tendência à contração do desenvolvimento das forças produtivas, é necessário considerar o conjunto desse período e não unicamente uma de suas fases específicas, como por exemplo a fase particularmente próspera que seguiu à Segunda guerra mundial. Ora, o desenvolvimento das forças produtivas durante o período que cobre as sete primeiras décadas do século XX se realiza a um ritmo inferior ao da segunda metade do século anterior. A diferença é até mais importante se considerarmos o conjunto do século XX.
O período próspero após a Segunda guerra mundial é um fenômeno certamente excepcional durante a decadência e já não se reproduzirá nunca mais na medida em que os fatores que o permitiram já se esgotaram:
Não existe a menor perspectiva de verdadeira solução à crise aberta no final dos anos 60; muito pelo contrário, só pode agravar indefinidamente. Entretanto, fazer corresponder a fase de decadência unicamente com esse período é ignorar um fenômeno maior da decadência, a guerra mundial, de uma amplitude e com destruições cujas proporções eram totalmente desconhecidas durante as guerras dos períodos anteriores e que é um fator essencial do risco de destruição da sociedade.
"Como atua a queda da taxa de lucro?"
A tendência decrescente à queda da taxa de lucro é efetivamente uma contradição do modo de produção capitalista, assim como Marx pôs em evidencia no livro 3 do Capital. Entretanto, não é a única nem tampouco necessariamente a mais determinante. Como temos dito, a vanguarda revolucionária era unânime, quando se fundou a IC em 1919, em reconhecer a entrada do sistema em sua fase de decadência. Era muito mais heterogênea, também o vimos, no que considera as implicações dessa modificação na vida do capitalismo. Era ainda mais heterogênea considerando a análise das causas econômicas da mudança de período. Rosa Luxemburgo e Lênin produziram duas análises diferentes do imperialismo. A de Luxemburgo toma mas amplamente em conta a dinâmica do desenvolvimento do capitalismo dentro de um mundo não capitalista e que precisa mercados extra-capitalistas para poder se desenvolver. Quando estes já começam a ser insuficientes diante das necessidades enormes da acumulação, então a máquina começa a ficar enferrujada. É dentro deste quadro de referência que, de nosso ponto de vista, se deve tomar em conta a tendência decrescente da queda da taxa de lucros cujos efeitos negativos para a economia capitalista se conjugam com os da saturação de mercados.
"Como compreender a onda de violência nos bairros suburbanos franceses?"
Esta questão se repetiu em todas as reuniões. Por duas razões ao menos: por um lado a propaganda mediática que se fez no Brasil sobre esses acontecimentos, como na maioria dos países, e por outro a perplexidade que provocam. Não vamos entrar aqui nos detalhes de nossa análise que pode ser lida num comunicado que publicamos, inclusive em português, em nosso site Internet. Pusemos em evidência que essas revoltas estéreis e sem futuro expressam acima de tudo o desespero e a total ausência de perspectivas dessa parte dos filhos dos operários que nunca foram nem serão integrados ao mundo do trabalho, ou apenas o serão na precariedade e em condições miseráveis. Insistimos em que não são uma expressão, nem sequer confusa, da luta de classes, mas que podem perfeitamente ser utilizados contra a classe operária, em particular pelo reforço do aparelhamento policial nos bairros operários.
"Qual são a significação e as implicações do crescimento do fundamentalismo religioso? Pudemos ver que também pode servir para provocar guerras, como no Oriente Médio"
O crescimento do fundamentalismo é uma outra manifestação da ausência total de perspectiva no seio desta sociedade que também leva a aberrações como são os atentados suicidas. E embora semelhantes aberrações sejam o produto de seu próprio sistema, isso não impede a burguesia utilizá-las como pretextos para desencadear guerras pela defesa de seus interesses imperialistas. De fato, esse fenômeno de decomposição da sociedade capitalista é produto da acumulação das contradições do capitalismo, que podem levar mesmo à destruição da humanidade se a classe operária não for capaz de impor sua própria solução revolucionária."Existe uma via alternativa à luta de classes, é a luta das etnias oprimidas ou a de emancipação da mulher"
A sociedade de classes carrega consigo a opressão das minorias, a discriminação racial, a desigualdade entre homem e mulher… O capitalismo não é uma exceção à regra. Não obstante, a luta especifica pela a emancipação da mulher ou contra o racismo não tem a menor possibilidade de triunfar enquanto estiver de pé a sociedade de classes, e também não pode mudar em nada a sociedade visto que não questiona seus fundamentos. Todos estes problemas só encontrarão uma verdadeira solução quando for abolido o capitalismo e durante a transformação da sociedade em direção as relações comunistas no conjunto do planeta. Não existe pois nenhuma alternativa à luta revolucionária da classe operária para liberar a humanidade das desigualdades e demais calamidades que atualmente a esmagam.
"Como podem convergir a luta da classe operária e a das camadas não exploradoras em uma luta comum para destruir o capitalismo?"
A classe operária é a única classe revolucionária da sociedade. Entretanto, isto não implica que tenha que fazer a revolução contra toda a sociedade. Muito pelo contrário, terá que levar atrás de si, em sua luta revolucionária, todas as camadas não exploradoras da sociedade, que objetivamente estão interessadas na queda do capitalismo. Mas para poder desempenhar este papel, a classe operária tem que ser capaz de afirmar-se em sua luta como a classe revolucionária da sociedade, com seu projeto revolucionário de derrubada do capitalismo e de instauração de uma outra sociedade. O pior que possa acontecer é que a classe operária, diluindo-se nos movimentos de revolta de todas aquelas camadas afundadas na miséria pela crise mas sem a menor perspectiva, seja incapaz de afirmar-se como classe revolucionária desta sociedade. Semelhante perigo existe realmente e foi evidenciado por exemplo pelas revoltas estéreis de 2001 na Argentina, quando muitos proletários foram conduzidos por uma multidão de elementos de todo tipo e em particular por partes da pequena e média burguesia arruinadas pela crise.
"Que alianças são possíveis entre a classe operária e movimentos como o dos Sem terra?"
Este exemplo é uma ilustração da impossibilidade atual de fazer convergir atrás do movimento da classe operária um movimento como o dos camponeses sem terra, enquanto estes não abandonarem sua especificidade. É sabido hoje que este movimento está totalmente controlado pelo Estado. Em que suas reivindicações são conciliáveis com as da classe operária? Em nada! Enquanto a recusa da classe operária a sofrer os ataques impostos pela crise do capitalismo já constitui a base da critica radical da ordem capitalista, é muito diferente das reivindicações totalmente reacionárias do Movimento dos Sem terra, que podem resumir-se ao direito de todos à propriedade."Como analisam vocês a política de Chávez comparada com a de Lula?"
Várias intervenções assinalaram que a política do governo de esquerda de Lula não se diferenciava dos governos de direita que lhe precederam, já que se constata que se incrementaram os níveis de empobrecimento da população no Brasil. Entretanto, houve muitas perguntas, dúvidas e inclusive simpatias com respeito ao governo do Chávez na Venezuela, expondo que este sim orientava os recursos do estado para o bem-estar da população e desenvolvia uma valente luta contra o imperialismo americano, diferente da tímida posição da burguesia brasileira.
O fato de que na Venezuela tenha chegado ao poder uma fração burguesa "radical" de esquerda é uma conseqüência do alto grau de decomposição da burguesia venezuelana, que foi incapaz de colocar no poder setores moderados de esquerda tal como pôde fazer a burguesa brasileira por exemplo; é por isso que a fração chavista do capital nacional, constituída por setores da burguesia e a pequena burguesia que em sua maioria foram excluídos dos governos anteriores, desenvolve uma política de exclusão dos outros setores da burguesia, o que ocasiona uma permanente confrontação entre eles, na qual foi implicado o proletariado venezuelano.
O chavismo, com a assessoria do governo cubano e uma plêiade de dirigentes e intelectuais da esquerda latino-americana e mundial, com o apoio dos movimentos antiglobalização e altermundialistas, além de ser sustentado por uma montanha de dólares produto das exportações petroleiras (e da exploração da classe operária venezuelana), desenvolveu um programa de governo chamado "revolução bolivariana", cujo fundamento é o programa nacional-capitalista de Estado simbolizado pelas forças guerrilheiras dos anos 60. A chamada "revolução bolivariana" nada tem a ver com a revolução proletária; muito pelo contrário, esta se sustenta pela exploração da classe operária, por um ataque ideológico e físico à classe operária, próprio dos regimes estalinistas e fascistas. O chavismo, igual aos governos de Lula no Brasil, Kirchner na Argentina, etc., só pode vender ilusões ao proletariado e redistribuir a miséria entre os pobres, tal como o faz todo governo que tem como fundamento a exploração da força de trabalho; o que explica que os níveis de empobrecimento cresçam na Venezuela, tal como acontece no resto dos países capitalistas.
No capitalismo decadente todo estado necessariamente desenvolve uma política imperialista contra as outras nações. Esta situação se deve fundamentalmente a que diante das crescentes contradições econômicas, cada nação se vê obrigada a uma política cada vez mais militarista para tentar manter-se no campo imperialista mundial.
A força da influência de um país na arena imperialista depende de seu poder econômico, militar e das condições geopolíticas; por exemplo é evidente que os EUA, primeira potência mundial, tem a maior capacidade para impor sua política imperialista a nível mundial.
O "anti-imperialismo" barulhenta do Chávez contra Bush e os EUA, não é mais que uma campanha ideológica desenvolvida a nível interno e externo para obter o apoio da classe operária e dos explorados à própria política imperialista da burguesia venezuelana para o controle de suas áreas de influência (O Caribe, Centro e parte da América do Sul). O governo chavista dedica importantes recursos financeiros ao serviço desta campanha para que os dirigentes, intelectuais e grupos da esquerda "radical" da região lhe sirvam de caixa de ressonância; ele também tenta aproveitar as dificuldades do imperialismo americano em outras partes do mundo (principalmente no Iraque), que aumentam sua impopularidade e dificultam sua oposição às veleidades imperialistas da burguesia Venezuelana.
As burguesias da região, em particular suas frações de esquerda, compartilham, apóiam e exploram a seu favor a megalomania do Chávez e seu frenesi anti-americano, na medida em que o discurso chavista corresponde a seus interesses geopolíticos. Em particular, a estratégia imperialista da burguesia brasileira, menos barulhosa que a da Venezuela e localizada em um terreno mais diplomático, é mais efetiva contra os interesses do EUA. Isto se observa pela grande influência do Brasil nas negociações do ALCA, onde a burguesia brasileira faz uso de seu caráter de primeira potência econômica da região com um peso geopolítico importante, que o governo de Lula explorou de maneira muito inteligente.
O proletariado deve enfrentar e denunciar a ideologia "anti-imperialista", já que é utilizada para arregimentá-lo nas bandeiras e interesses de cada capital nacional. A luta do proletariado contra o imperialismo está inscrita em sua luta cotidiana contra a sua própria burguesia, pois o imperialismo é o "modus vivendi" do capitalismo decadente."Como conceber uma perspectiva revolucionária em uma sociedade de consumo?"
A sociedade atual não é uma sociedade de consumo para todo mundo. Não é muito difícil dar-se conta disso. O capitalismo estendeu e generalizou, como nunca nenhuma sociedade o tinha feito até hoje, o reino da mercadoria. Tudo neste mundo é objeto de compra, tudo é mercadoria. O capitalismo também é o sistema que foi capaz de desenvolver as forças produtivas como nenhum antes, a ponto de tornar perfeitamente credível a possibilidade da abundância para todos na Terra. O único obstáculo que encontra, é o próprio sistema que produz, não para satisfazer as necessidades do homem mas sim para o ganho e a acumulação. Uma contradição do mundo atual está em que uma proporção crescente da humanidade e da classe que produz as riquezas, a classe operária, tem acesso a uma parte cada vez mais reduzida das mercadorias fabricadas, mesmo considerando as que são vitais. Este enorme contraste entre o que poderia ser a vida na sociedade se a humanidade pudesse aproveitar todas as riquezas acumuladas e o que é em realidade, constitui um fator de tomada de consciência da necessidade da derrubada revolucionária do capitalismo.
"O caráter antidemocrático da revolução não faz correr o risco de que a classe operária a rechace?"
A propaganda burguesa diz que a revolução é a pior coisa que possa acontecer porque é antidemocrática. Mas em realidade do que se trata? É a derrubada de uma classe minoritária, a burguesia, com objetivo o bem-estar da imensa maioria, a classe operária e o conjunto das camadas não exploradoras da sociedade.
Quanto à democracia burguesa, não é mais que a máscara hipócrita da ditadura do capital. E quanto mais se confrontar a classe operária ao capital, melhor aparecerá essa ditadura pelo que é.
"Como fazer a revolução mundial quando o proletariado americano apóia a sua própria burguesia?"
Deixando de lado certa propaganda interessada por essa mentira, o que nos permite dizer que a classe operária americana apóia a sua própria burguesia? A classe operária nos Estados Unidos atualmente não tem meios para opor-se à guerra no Iraque. Esta situação resulta de um nível ainda insuficiente da luta de classes a nível internacional e no próprio país. Mas significa que essa fração do proletariado internacional adere a essa guerra? É evidente que não, como o demonstram as dificuldades do Estado norte-americano para recrutar novos efetivos. Como demonstram também as ações das mães ao proibir o acesso das escolas aos sargentos recrutadores. Não estamos em um período em que frações majoritárias do proletariado nos países mais importantes estejam dispostas a apoiar o esforço de guerra de sua própria burguesia, como ocorreu nos anos 30. Naquele tempo, os proletários norte-americanos, ingleses, alemães, franceses, russos, etc., eram massacrados por milhões, e de igual maneira também massacravam, nos exércitos regulares ou na resistência, por interesses que não eram seus mas sim os das diversas frações nacionais da burguesia mundial.
"Como podem mobilizar-se os desempregados?"
Os desempregados são uma parte da classe operária e sua luta não é diferente da da classe operária no seu conjunto. O fato de estarem privados de trabalho e da proximidade de seus companheiros de luta dificulta a mobilização, em particular pelo fenômeno de atomização crescente da vida social. Por isso é importante que façam o possível para unir às mobilizações dos operários que têm trabalho quando tiverem, e que estes chamem os desempregados a participar de suas manifestações.
Por outra parte, temos quer ser consciente que o Estado burguês não fica inativo com respeito ao potencial explosivo representado pela quantidade sempre maior de desempregados. Por isso tenta enquadrá-los, em particular encarregando-se de suas necessidades mais vitais através a distribuição de comida, utilizando para isso associações, a igreja, os partidos de esquerda, todas as organizações a seu serviço (por exemplo, em Argentina, nos "comedores" que são locais de distribuição de comida). Semelhante assistência não é neutra e tem como objetivo manter na dependência do estado sem questionar os fundamentos da miséria, os operários que beneficiam desta ajuda. Por outro lado, tais instituições servem também para desviar a luta dos operários que ainda têm um trabalho na direção de uma falsa solidariedade, oposta à solidariedade de classe (como foi o caso durante a onda de lutas no verão de 2005 em Argentina).
"Não é diferente hoje a classe operária da que fez a revolução em 1917?"
A classe operária hoje continua sendo a classe que produz o essencial das riquezas da sociedade. Continua sendo a classe explorada e sem ela não poderia existir o capitalismo. Quaisquer que sejam as modificações sociológicas acontecidas no seu seio, estas não modificam em nada seu caráter revolucionário. Se a proporção de operários industriais no conjunto da classe operária era mais importante no momento da onda revolucionária de 1917-23 que o é hoje em dia, não é por isso que não existem em seu seio outros setores diferentes dos operários de indústria capazes de uma grande combatividade e de desenvolver uma consciência de classe. A mobilização no setor do ensino na Itália em 1987 demonstrou que os proletários deste setor constituam a ponta de lança da vontade de organizar-se fora e contra os sindicatos. Os operários na Rússia em 1917 tinham também essa fama de conhecer bem a história de sua classe, apesar de que, em geral, não sabiam ler, e particularmente a história da Comuna de Paris. Existe nesse plano uma verdadeira diferença, visto que hoje as novas gerações se caracterizam por uma ignorância importante da história. Mas temos confiança na capacidade do proletariado revolucionário para apropriar-se de sua própria história à medida que o exijam as condições. Para isso terá que contar com a intervenção das organizações revolucionárias para suscitar e acompanhar esse esforço.
"A revolução não será uma idéia saída de moda?"
A revolução segue hoje mais que nunca sendo uma necessidade e segue sendo possível. A primeira onda revolucionária mundial se desenvolveu em reação ao aprofundamento brutal na barbárie provocado pela Primeira guerra mundial. Hoje, a classe revolucionária encarregada de aplicar a sentença de morte que pronunciou a história contra o capitalismo dispõe de enormes reserva de combatividade para desenvolver sua luta frente a uma crise econômica insolúvel que só pode aprofundar. Desde que retomou o caminho histórico de sua luta em 1968, o proletariado conheceu muitas dificuldades, em particular a de um retrocesso de mais de um decênio de sua consciência e de sua combatividade com as campanhas sobre a "morte do comunismo" que acompanharam o a queda dos regimes estalinistas. Mas de novo volta a ser capaz de desenvolver através da luta, sua consciência e a confiança nas suas capacidades revolucionárias.A CCI faz um balanço totalmente positivo dessas quatro intervenções públicas.
Além de constituir uma "estréia" para a CCI ao realizar no Brasil, estas reuniões foram uma das poucas ocasiões que teve a CCI de intervir em comum com outra organização proletária[1] [6]. Por nossa parte, fazemos também um balanço positivo desta experiência considerando tanto a qualidade da colaboração com a Oposição Operária como o impacto que pôde ter no auditório essa unidade de intervenção. Que duas organizações distintas, com diferenças ou divergências entre elas, dirijam-se juntas a sua classe prefigura a capacidade dos diferentes elementos da vanguarda revolucionária para lutar unida pela defesa da causa que lhes é comum, a vitória da revolução. Deve-se precisar aqui que tinha ficado claro entre nossas duas organizações que, nas intervenções nas reuniões públicas, dar-se-ia a prioridade à questão da organização do proletariado mediante seus próprios órgãos, os conselhos operários, em sua luta revolucionária, assim como a denúncia da mistificação democrática e parlamentar e do papel contra-revolucionário dos sindicatos. Mas também tínhamos deixado claro que não íamos tentar ocultar nossos enfoques às vezes diferentes ou talvez diferencias considerando tal ou qual questão, e que efetivamente se expressaram nos argumentos de uns e de outros. Também nossas duas organizações convieram que essas diferenças deviam debater-se em profundidade para assim captar melhor a sua realidade.
Da nossa parte, estamos mais que nunca dispostos a repetir a experiência. Uma vez mais, queremos agradecer a nossos simpatizantes pela qualidade de seu compromisso a nosso lado e saudamos a Oposição Operária por sua atitude aberta e solidária, ou seja, proletária.
CCI (2 – 12 – 05)[1] [7] Uma reunião pública comum com a CWO (Communist Worker's Organisation) representante do BIPR na Grã-Bretanha, já foi organizada na ocasião do octogésimo aniversário da revolução de 1917. Infelizmente esta experiência não teve continuação, a CWO e o BIPR achando impossível repeti-la por conta de um dito "idealismo" da CCI ilustrado especialmente por sua analise da existência de uma dinâmica histórica da luta de classe em direção a confrontação entre proletariado e burguesia.
Ligações
[1] https://pt.internationalism.org/icconline/2006_reunioes_publicas#_ftn1
[2] https://pt.internationalism.org/icconline/2006_reunioes_publicas#_ftnref1
[3] http://opop.sites.uol.com.br/
[4] https://pt.internationalism.org/content/60/uma-participacao-e-um-dinamismo-prometedores
[5] https://pt.internationalism.org/tag/1/2/decad%C3%AAncia-do-capitalismo
[6] https://pt.internationalism.org/icconline/2006_reunioes_publicas-3#_ftn1
[7] https://pt.internationalism.org/icconline/2006_reunioes_publicas-3#_ftnref1