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A maioria dos historiadores oficiais, fora os da extrema-direita, apresentam a guerra civil como uma defesa heróica de um governo eleito democraticamente contra a ameaça do fascismo. Os trotskistas defendem uma versão mais crítica, dizendo que na realidade a guerra civil não era nada menos que a revolução espanhola. Enquanto concordavam com a necessidade de lutar a favor da república contra Franco (Trotski dizia para seus seguidores "serem os melhores soldados da república"), colocam que isso era compatível com a luta pela derrubada do capitalismo e a instauração de uma verdadeira "república" dos trabalhadores. Quanto aos anarquistas, a maioria deles, chegou até dizer que a coletivização das fábricas e fazendas sob o controle do sindicato anarquista, a CNT, constituiu o ponto mais alto alcançado na luta para uma sociedade comunista.
A Esquerda comunista, que publicava a revista Bilan nos anos 1930, tinha uma visão muito diferente. Para ela, democracia e fascismo eram duas asas do capitalismo, ambas contra-revolucionarias e anti-operárias. Analisava o período dos anos trinta como de profunda derrota da classe operária, abrindo a porta para uma segunda guerra imperialista mundial. Ambas ideologias fascista e democrática assumiram seu papel de mobilizar os operários para a guerra que estava se aproximando e a matança na Espanha era uma preparação dos massacres mais amplos em perspectiva.
Isso não significa que Bilan não tinha a percepção da existência de uma real luta de classes na Espanha. Saudou o movimento espontâneo de greves e o surgimento do proletariado de Barcelona contra o golpe de Franco de Julho 36, o que ilustra a capacidade da classe operária em se defender quando luta com seus próprios métodos de luta. Mas percebeu também que este movimento de classe inicial quase que imediatamente tinha se desviado para uma guerra inter-imperialista; uma guerra em que se envolveram as grandes potências, a Alemanha e a Rússia soviética, em cada um dos dois campos imperialistas. E as forças políticas, que se envolveram mais e tiveram uma influencia decisiva em desviarem a classe operária da luta em defesa de seus interesses de classe para um terreno burguês, foram as forças de "esquerda", incluindo a CNT anarquista, que transformou as milícias operárias de Julho de 36 em núcleo da armada republicana, e a ocupação das empresas para a autogestão das empresas cuja economia de guerra dependia.
Deve-se destacar que essa transformação aconteceu sem que houvesse nenhuma resistência por parte da classe operária. E em maio de 1937, o real conflito no seio do campo "antifascista" veio à tona, quando as forças policias stalinistas tentaram tomar o controle da central telefônica de Barcelona e "extirpar" tudo que era considerado como obstáculo à máquina de guerra republicana. Esta ação provocou barricadas e novamente uma greve geral, dessa vez opondo não os operários e Franco, mas os operários e o aparelho repressivo da república. Isso abriu uma divisão de classes entre os anarquistas que tinham se convertido em parte do aparelho de estado (na realidade, a CNT oficial) e os que ficaram do lado proletário das barricadas, como Camillo Berneri ou o grupo dos Amigos de Durruti, como também alguns elementos do movimento trotskista.
A Fração da esquerda italiana e a recém Fração belga, escreveram conjuntamente o manifesto sobre os acontecimentos de maio-junho de 1937 que publicamos com o texto seguinte. Mais de setenta anos depois, ele constitui uma referência quanto a sua clareza política e sua fidelidade inabalável ao internacionalismo proletário. Mesmo se dentre algumas das suas formulações não sejam mais nossas hoje (por exemplo, a idéia de que o partido seria o "cérebro" da classe), a insistência do manifesto sobre a necessidade da organização política comunista como a melhor defesa da independência da classe operária é tão válida hoje como era naquela época.