Submetido por CCI em
Manifesto do primeiro congresso da CCI
A CCI foi fundada em janeiro de 1975 pelos diferentes grupos políticos que tinham nascido como conseqüência do reatamento histórico da classe operária no final dos anos 60 expresso entre outras pela greve de Maio 68 na França, o Cordobazo argentino de 69, o "Outono Quente" Italiano do mesmo ano (outubro e novembro de 1968), a greve dos operários do Báltico na Polônia nos meses de dezembro e janeiro de 1970-71. Este despertar proletário pôs fim a quatro decênios de contra-revolução e anunciava todo um período de combates de classe encarniçados à medida que piorava a crise econômica que o tinha provocado.Manifesto do Iº congresso da CCIO espectro da revolução comunista volta a percorrer o mundo. Durante decênios, as classes dirigentes acreditaram ter conjurado para sempre os "demônios" que agitaram o proletariado no século xix e no início do século xx. Certamente, o movimento operário nunca havia padecido de uma derrota tão terrível e duradoura. A contra-revolução que esmagou a classe operária européia após as lutas de 1848, a que se seguiu à heróica e desesperada tentativa da Comuna, o refluxo e a desmoralização que advieram com o fracasso da experiência de 1905 na Rússia; tudo isso não foi nada comparado com o peso que se abateu durante meio século sobre todas as manifestações da luta de classes. O pânico que tomou conta da burguesia quando a grande onda revolucionária que seguiu a Primeira Guerra Mundial foi o que marcaria as pautas da contra-revolução, ao ser aquela onda a única que até agora tinha estremecido até os alicerces do sistema capitalista. Após haver atingindo tal altura, o proletariado sofreu a maior derrota, a maior desesperança, a maior humilhação da sua história. Frente a ele a burguesia manifestou a maior arrogância, até o ponto de apresentar as maiores derrotas da classe operária como "vitórias" desta, até o ponto de fazer da idéia mesma de Revolução uma espécie de anacronismo, de um mito herdado de uma época teslocada.Porém hoje a chama proletária tem voltado a ressurgir pelo mundo. De maneira constantemente confusa, vacilante, porém com sobressaltos que às vezes surpreendem inclusive os revolucionários, o gigante proletário tem levantado a cabeça voltando a fazer tremer o antigo edifício capitalista. Desde Paris a Córdoba (Argentina), desde Turin a Gdansk, de Lisboa a Xangai, desde o Cairo a Barcelona as lutas operárias voltam a ser o pesadelo dos capitalistas[1]. Ao mesmo tempo também, e tomando parte da nova entrada em cena social da classe operária, têm surgido grupos e correntes revolucionárias que se consagrando a imensa tarefa de reconstituição teórica e prática de uma das ferramentas mais importantes do proletariado, seu partido de classe.
É chagado a hora, para os revolucionários enquanto frutos e fatores ativos da renovação da luta do proletariado, de anunciar à sua classe a perspectiva dos combates que já está iniciando, de recordar-lhe os ensinamentos do seu passado para com ela poder forjar seu futuro e também destacar as tarefas que se apresentam diante dela, enquanto frutos e fatores ativos da renovação da luta do proletariado.
Esses são os objetivos do presente manifesto.
A classe operária sujeito da revolução
O proletariado é a única classe revolucionária do nosso tempo. Só ele tomando o poder político em escala mundial e transformando radicalmente as condições e fins da produção, pode ser capaz de tirar a humanidade da barbárie em que está envolvida.
A idéia de que a classe operária é a classe do comunismo, de que o lugar que ocupa no capitalismo faz dela a única classe capaz de derrubá-lo, é algo adquirido desde há mais de um século. Esta idéia aparece com força na primeira manifestação programática rigorosa do movimento proletário: o Manifesto Comunista de 1848. Expressa-se com letras luminosas na formulação da AIT, "a emancipação dos trabalhadores será obra dos próprios trabalhadores", que gerações de proletários continuam transmitindo como bandeiras dos seus combates sucessivos contra o Capital. Porém, o terrível silêncio ao qual a classe operária foi submetida durante meio século tem dado lugar a que apareça todo tipo de teorias sobre "a integração definitiva da classe operária", sobre "o proletariado, classe para o capital", sobre a "classe universal" ou acerca das "camadas marginais como sujeitos da revolução"; significa dizer, a toda uma série de antiguidades disfarçadas em "novidade" que tem vindo unir-se às tempestades de mentiras que a burguesia utiliza sem descanso para perpetuar a desmoralização dos trabalhadores e sua submissão ideológica ao capital.
O que a Corrente Comunista Internacional volta a afirmar hoje, em primeiro lugar e com veemência é, pois, o caráter revolucionário da classe operária, de nenhuma outra classe social além dela, no período atual.
Porém o fato de que essa classe, contrariamente às classes revolucionárias do passado, não tenha na sociedade que está chamada a transformar nenhum poder econômico onde apoiar seu futuro poder político, lhe impõe a conquista desse último como condição primeira para essa transformação. Por isso, ao contrário das revoluções burguesas que avançam de êxito em êxito, a revolução proletária virá necessariamente coroar uma série de derrotas parciais, porém trágicas. E quanto mais decididos são os combates da classe, mais trágicas são as derrotas.
A grande onda revolucionária que pôs fim a Primeira Guerra Mundial e que continuou durante mais de dez anos é uma clara confirmação de ambas as realidades: a classe operária é o único sujeito da revolução comunista e a derrota a companheira da sua luta até a vitória definitiva. Esse imenso movimento revolucionário que pôs abaixo o Estado burguês na Rússia, que fez tremer os países da Europa e ressoa com eco ensurdecedor até a China, proclama que o proletariado se presta a dar o golpe de misericórdia a um sistema que havia entrado na sua fase de agonia e que o proletariado está disposto a executar a sentença ditada pela história contra o capitalismo. Porém, ao ser incapaz de elevar à escala mundial o primeiro êxito de 1917, a classe operária terminou vencida e dominada. É então quando, de maneira negativa, fica confirmada a natureza revolucionária, exclusiva da classe operária: O fracasso no intento revolucionário mundial e o fato de ser a classe operária a única classe capaz de levar a cabo a revolução, e nada mais que ela, é a causa de que a sociedade continue caminhando sem remédio em direção a uma barbárie crescente.
A decadência do capitalismo
A Decadência do capitalismo que segue a Primeira Guerra Mundial, decadência da qual a sociedade não pode livrar-se sem revolução proletária, aparece desde então como o pior período da história da humanidade.
Em tempos passados, a humanidade havia suportado períodos de decadência, com sua correspondente série de calamidades e sofrimento inomináveis, porém foram poucos se comparados com o que a humanidade tem suportado desde mais de sessenta anos. As decadências das demais sociedades acarretaram escassez e fome, porém, nunca como hoje tal miséria humana tem sido atrelada ao desperdício de riquezas em que vivemos. Agora que o homem se apropriou de técnicas maravilhosas que lhe permitiram por a natureza ao seu serviço, se vê submetido aos caprichos desta, as catástrofes "naturais" climáticas ou agrícolas em condições ainda mais trágicas que no passado. Pior ainda, a sociedade capitalista é a primeira da história que na sua fase de declínio só pode sobreviver submetido a destruições cíclicas e massivas uma parte cada vez maior de si mesma. Verdade é que em outros períodos de decadência houve freqüentes enfrentamentos entre frações da classe dominante, porém é no que hoje vivemos está encerrada num ciclo inexorável e infernal de crise - guerra generalizada-reconstrução -crise... Ciclo que exige do gênero humano um terrível tributo em mortes e sofrimentos. Hoje em dia, técnicas de refinamento científico inaudito concorrem sem parar para aumentar o poder de destruição e de morte dos estados capitalistas, de tal maneira que se pode contar em dezenas de milhões as vítimas das guerras imperialistas e dos genocídios sistemáticos e industriais em que sobressaíram fascismo e stalinismo no passado e que continuam ameaçando-nos.
De alguma maneira, parece como que se a humanidade tivesse que pagar o reino da liberdade, ao que já se pode chegar graças ao domínio da técnica, com o reino das atrocidades mais espantosas que esse mesmo domínio permite.
Em meio a este mundo de ruínas e convulsões tem se desenvolvido como um câncer esse órgão fiador da estabilidade e da conservação social que é o estado. Este tem se intrometido nos mecanismos mais íntimos da sociedade e em particular na sua base econômica. Como o deus Moloc dos antigos, sua máquina monstruosa, fria e impessoal tem devorado a substância da sociedade civil e do homem. E longe de constituir um "progresso", o capitalismo de estado, que utilizando toda gama de formas jurídicas e ideológicas e os instrumentos de governo mais selvagens tem se apoderado da totalidade do planeta, é uma das manifestações mais brutais da putrefação da sociedade capitalista.
A contra-revolução
Entretanto, o instrumento mais eficaz que foi desenvolvido pelo capitalismo na decadência para assegurar sua sobrevivência tem sido a apropriação sistemática de todas as formas de luta e organização que a classe operária havia herdado do passado e que a troca da perspectiva histórica tornou caducas. Todas as táticas sindicais, parlamentares, frentistas que haviam possuído um sentido e uma utilidade para a classe operária no século XIX, se converteram em outros tantos meios para paralizar a sua luta, se transformando em arma fundamental da contra-revolução. Depois, precisamente porque todas as suas derrotas lhes foram apresentas como outras tantas "vitórias", a classe operária se envolveu na mais sinistra contra-revolução conhecida. Foi sem dúvida alguma o método fraudulento do "estado socialista", parido da contra-revolução na Rússia e apresentado como baluarte do proletariado quando já não era outra coisa que o defensor do capital nacional estatizado, o que constituiu em arma essencial para o enquadramento como para a desmoralização do proletariado. Os proletários do mundo inteiro, a quem a fogueira de 1917 fez nascer uma imensa esperança, se viram depois convidados a submeter incondicionalmente sua luta à defesa da "pátria socialista"; e os que dentre eles conseguiram dar conta do caráter anti-operário desta, a ideologia burguesa se encarregaria de infundi-los à idéia de que a revolução não poderia ter outro resultado que o havido na Rússia, quer dizer: O surgimento de uma nova sociedade de exploração e opressão.
Desmoralizada pelos fracassos dos anos vinte, porém, mais ainda pelas divisões entre, por um lado, aqueles que deslumbrados pelo outubro vermelho eram incapazes de perceber a degeneração e a traição dos partidos nascidos de então, e por outro lado aqueles que haviam perdido toda esperança na revolução, a classe operária não pôde aproveitar da crise geral do sistema nos anos trinta para voltar a ofensiva.
Ao contrário, de "vitória" em "vitória"; de pés e mãos atados foi arrastada para a segunda guerra imperialista, a qual, contrariamente a primeira, não lhe permitiu ressurgir de maneira revolucionária e em troca foi recrutada para as grandes "vitórias" da "resistência", do "anti-facismo" ou ainda das "libertações" coloniais e nacionais.
As etapas principais do refluxo e da integração do proletariado na sociedade burguesa assim como dos partidos da III Internacional representam outras tantas punhaladas no movimento da classe:
- 1920-21: Luta da Internacional Comunista contra sua esquerda sobre as questões parlamentar e sindical.
- 1922-23: Adoção pela IC das táticas de "Frente Única" e "Governo Operário", o que leva a formação na Saxônia e (Turigia??) de governos de coalizão entre comunistas e social-democratas, verdugos estes do proletariado alemão, quando todavia este ocupava as ruas.
- 1924-26: Surgimento da teoria da "construção do socialismo em um só país"; o abandono do internacionalismo proletário é reflexo da morte da IC e da passagem dos seus partidos para o campo da burguesia.
- 1927: Apoio político e militar da IC a Chiang Kaishek (Jiang Jieshi) que acaba com a matança pelas tropas, do proletariado e dos comunistas chineses.
- 1933: Triunfo de Hitler.
- 1934: Entrada da Rússia na Sociedade das Nações; quer dizer, reconhecimento por parte da corja de malandros ou malfeitores? Que a essa agrupa os que já são como eles. Essa grande "vitória" é, de fato, outro símbolo da grande derrota proletária.
- 1936: Criação das "Frentes Populares" e política de "Defesa Nacional" a qual leva os partidos "comunistas", de acordo com Stálin, a votar os créditos militares.
- 1936-39: Orgia antifascista na Espanha, matança de trabalhadores a serviço da democracia e da república.
- 1939-45: Segunda Guerra Mundial e enquadramento do proletariado nas distintas "resistências". Nessa guerra, a burguesia, com as experiências de antes, corta pela raiz, toda possível veleidade proletária, ocupando militarmente cada palmo de terra dos países vencidos. Ao ser incapaz de impor o fim da guerra com seu próprio movimento - tal como havia ocorrido em 1917-1918 - a classe operária sai da guerra ainda mais derrotada.
- 1945-65: Reconstrução e "libertação nacional": o proletariado convidado a levantar o mundo das suas ruínas em troca de algumas migalhas que o desenvolvimento da produção permite a burguesia distribuir. E nos países atrasados, a burguesia nacional recruta o proletariado em nome da independência contra o imperialismo.
As frações comunistas de esquerda
Em meio a essa debandada da classe e do triunfo absoluto da contra-revolução, as frações comunistas de esquerda que foram se separando dos partidos em degeneração, empreenderam uma difícil tarefa de salvaguarda dos princípios revolucionários. Tiveram que se opor às forças conjugadas de todas as frações da burguesia, não cair nas mil e uma armadilhas que esta lhes preparava, fazer frente ao enorme peso da ideologia ambiente na sua própria classe, suportar o isolamento, a perseguição física, a desmoralização, o esgotamento, o desaparecimento e a dispersão dos seus membros. As frações comunistas de esquerda, com esforço sobre-humano e heróico, empreenderam construir uma ponte entre os antigos partidos do proletariado passados para o lado inimigo, e os que a classe fará surgir novamente na próxima retomada revolucionária, para, por um lado manter em vida os princípios proletários que a IC e seus partidos puseram à venda e, por sua vez partindo desses princípios fazer um balanço das derrotas passadas para tirar novos ensinamentos, que a classe deverá apropriar-se nos futuros combates. Durante anos, as diferentes frações e em particular as Esquerdas alemã, holandesa e, sobretudo italiana prosseguiram uma notória atividade de reflexão e denúncia da traição dos partidos que todavia se intitulam proletários.
Porém a contra-revolução foi por demais profunda e longa para que pudessem sobreviver às frações. Golpeadas com dureza pela Segunda guerra mundial e pelo fato de que essa não produzisse nenhum surgimento de classe, as últimas frações que haviam sobrevivido até então desapareceram progressivamente ou iniciaram um processo de degeneração, esclerose ou regressão. Assim, pela primeira vez desde há mais de um século, se rompe o laço orgânico que unia como elo no tempo e espaço as organizações políticas do proletariado tais como a Liga dos Comunistas, a Primeira, Segunda e Terceira Internacional e as frações que desta saíram.
A burguesia alcançou momentaneamente os fins que se propunha: calar toda expressão política de classe, que a revolução aparecesse, sem réplica possível, como um anacronismo empoeirado, vestígio de tempos passados, com uma especialidade exótica para países atrasados ou falsificando totalmente seu sentido perante os trabalhadores.
A crise do capitalismo
Porém desde o fim dos anos 60, essa perspectiva tem mudado de maneira fundamental porque já está terminada a situação de "prosperidade" econômica que veio com a reconstrução do pós-guerra, "prosperidade" que não só os adoradores do capitalismo como também alguns mais, que se diziam inimigos seus, apresentavam como eterna. Desde metade dos anos sessenta, após vinte anos de crescimento eufórico, o sistema capitalista volta a ver de frente um pesadelo que parecia haver passado a história plasmada em imagens amareladas da anti-guerra: a crise. Esta continua aprofundando de maneira inexorável, o que é uma patente demonstração da justeza da teoria marxista, ainda que toda uma série de falsificadores a soldo da burguesia, de universitários ansiosos de "novidades", de pseudo-revolucionários com cátedra, de Prêmios Nobel e de acadêmicos, de "experts" e de "celebridades, assim como de toda classe de "céticos" e de amargurados não tem deixado de proclamar sua superação, sua "caducidade" e sua "quebra"."
A retomada proletária
Com o aprofundamento da desordem econômica, a sociedade se encontra outra vez diante da inevitável alternativa que inaugura cada crise aguda do período de decadência: guerra mundial ou revolução proletária ([2]).
Hoje entretanto a perspectiva é radicalmente diferente da que abriu a grande catástrofe econômica dos anos trinta. Naquela época, o proletariado vencido não tinha forças para aproveitar a nova quebra do sistema e lançar ao assalto deste. Pelo contrário, a quebra dos anos trinta teve como efeito um maior agravamento da derrota.
O proletariado atual é diferente do de entre guerras. Por um lado, da mesma maneira que os pilares da ideologia burguesa, as mistificações que no passado aplataram a consciência proletária tem se esgotado progressivamente: o nacionalismo, as ilusões democráticas, o anti-fascismo que foram utilizados até a exaustão durante meio século já não tem o mesmo impacto do passado. Por outro lado, a nova geração operária não têm suportado as derrotas das anteriores. Os proletários que hoje enfrentam a crise não têm a experiência dos seus antepassados, porém também não estão imersos na desmoralização. A formidável reação, que desde 1968-69 tem oposto a classe operária às primeiras manifestações da crise significa que a burguesia não está em condições para impor a única saída que é capaz de dar à crise , significa dizer, um novo holocausto mundial. Primeiramente teria de poder vencer a classe operária: a perspectiva atual não é pois a da guerra imperialista e sim da guerra de classes generalizada. Se bem a burguesia prossegue os preparativos para a primeira, é a segunda que cada vez mais lhe preocupa: o aumento impressionante da venda de armas de guerra, único setor onde não há crise, oculta momentaneamente o reforço geral e sistemático dos dispositivos de repressão, de luta contra a "subversão" por parte dos estados capitalistas. Entretanto, não é essencialmente assim que o capital se prepara para os enfrentamentos de classes, e sim em melhor instituir toda uma série de meios de enquadramento do proletariado e de desvio das suas lutas. Porque contra uma combatividade operária intacta e em plena renovação, a burguesia não pode opor, sem cada vez com maiores dificuldades, a simples repressão aberta que faz com que corra o risco de unificar as lutas em vez de dissipá-las.
As armas da burguesia
Para estar em condições de dar rédeas soltas a uma repressão em escala, a burguesia começará como no passado, por tentar desmoralizar os operários desviando suas lutas e as conduzindo a um beco sem saída. Para isso proporá três temas essenciais de mistificação com os quais acorrentar a classe ao seu capital nacional e seu estado: o anti-facismo, a autogestão e a independência nacional.
- O Anti-fascismo, diante de circunstâncias históricas diferentes das dos anos trinta, ao não ter em frente um "fascismo" bem "concreto" como o de Hitler ou Mussolini e por não ser a preparação da guerra imperialista sua tarefa imediata, terá um sentido mais amplo que no passado. A leste como a oeste, será em nome da defesa das "conquistas democráticas" e das "liberdades" contra as "ameaças reacionárias", "autoritárias", "repressivas", "fascistas" e até "estalinistas" que as frações "de esquerda", "progressistas", "democráticas" ou "liberais" do Capital vão combater as lutas proletárias. Cada vez mais constante, os operários acabam desconcertados ao constatar que são os piores agentes da "reação" e da "contra-revolução" quando passam a lutar para defender seus interesses ([3]).
- A Autogestão, mito que será favorecido pelas quebras em série provocadas pelas crises, como também por uma reação compreensível contra o império burocrático do estado sobre toda a sociedade, será também uma arma valiosa que a esquerda do capital proporá contra os trabalhadores; esses terão que fazer ouvidos surdos aos cantos da sereia de todas as forças capitalistas que em nome da "democratização da economia", da "expropriação" dos patrões ou do estabelecimento de "relações comunistas" ou "mais humanas" desejam de fato que participem da sua própria exploração, opondo-se à sua unificação, mantendo-os divididos por empresas e bairros.
- A Independência nacional, por fim, versão moderna da "Defesa Nacional", de triste memória; a burguesia empregará todos os recursos, e em particular nos países mais débeis, onde precisamente é ainda mais absurda a união interclassista contra tal ou qual imperialismo, colocando a culpa das crises e do aumento da exploração às "pretensões hegemônicas" deste ou daquele país, às multinacionais ou a qualquer outro capitalismo apátrida.
Em nome de uma ou outra dessas mistificações ou de todas à mesma vez, o capital exortará por todas as partes aos trabalhadores que renunciem suas reivindicações e que se sacrifiquem na espera da superação da crise. Como no passado os partidos de esquerda e "operários" se destacarão nesta tarefa repugnante, e poderão contar com o apoio "crítico" das correntes esquerdistas de todas as plumagens que propagam os mesmos objetivos, porém com métodos radicais. Faz 57 anos, o Manifesto da Internacional Comunista, colocava em guarda a classe operária contra esses perigos.
- "Os oportunistas, que antes da Guerra, incitavam aos operários moderar suas reivindicações em nome da passagem progressiva ao socialismo, que exigiram durante a guerra a humilhação da classe operária e a sua submissão em nome da união sagrada e a defesa da pátria, pedem agora novos sacrifícios e abnegações ao proletariado para superar as terríveis conseqüências da guerra. Se semelhantes sermões tivessem eco na classe operária, o desenvolvimento capitalista seguiria restabelecendo-se sobre os cadáveres de várias gerações, com formas novas, todavia de maior concentração e maior monstruosidade. E a perspectiva de uma nova e inevitável guerra mundial".
A história tem demonstrado, através de uma tragédia inominada, como clarividente era a denúncia das mentiras burguesas feitas pelos revolucionários de 1919. Hoje, quando a burguesia volta a por de pé o formidável arsenal político que lhe permitiu no passado conter e vencer o proletariado, a CCI reivindica as palavras da Internacional Comunista, dirigindo-se de novo à classe operária.
"Proletários, lembrem-se da guerra imperialista!", clamava a I.C. Proletários de hoje, lembrem-se da barbárie de meio século transcorrido e imaginem o que espera a humanidade se também desta vez não rechaçarem com suficiente vigor os discursos entontecedores da burguesia e seus lacaios!
O desenvolvimento da luta e da consciência proletária
Porém, se bem que a classe capitalista afia metodicamente suas armas, o proletariado por sua vez não é a vítima submissa que aquela deseja ter pela frente.
Embora apresentem aspectos desfavoráveis, as condições em que o proletariado tem renovado nas lutas, estas estão fundamentalmente a seu favor. Com efeito, pela primeira vez na história, um movimento revolucionário da classe não se desenvolve depois de uma guerra e sim acompanha uma crise econômica do sistema. É verdade que a guerra havia contribuído para que o proletariado compreendesse rapidamente a necessidade de lutar no terreno político, arrastando em sua direção classes não proletárias distintas da burguesia; porém só tinha constituído um fator poderoso de tomada de consciência para os proletários dos países do campo de batalha e em especial para os dos países vencidos.
A crise que hoje se desenvolve não deixa a salvo nenhum país do mundo, e quanto mais tenta a burguesia frear o curso, mais se estendem os efeitos. Por isso, nunca um levantamento da classe havia sido de tal amplitude como o de hoje. Certo que o ritmo é lento e irregular, porém sua extensão vem confundir os profetas da derrota que não param de discursar longamente sobre o caráter "utópico" de um movimento revolucionário do proletariado em escala mundial. Por outra parte, ao encarar hoje as tarefas imensas que lhe incubem e ao haver perdido o essencial das suas tradições de classe, o proletariado terá que aproveitar o desenvolvimento lento da crise que o golpeia e dá um ritmo na sua resposta de classe, para aperfeiçoar sistematicamente suas experiências e sua organização. Será através de lutas econômicas sucessivas que tomará consciência do caráter político do seu combate. Multiplicando e ampliando suas lutas parciais forjará os instrumentos do enfrentamento generalizado. Frente às lutas, o capital começará a lamentar e utilizará o fato real de que não pode ceder nada, para pedir "moderação" e "sacrifícios" aos operários. Porém estes compreenderão que se bem as lutas são infrutíferas e por tanto perdidas de antemão no plano estritamente econômico, são em troca, a condição mesma da vitória decisiva, porque são um passo a mais na compreensão da quebra total do sistema e da necessidade de destruí-lo.
Contra todos os predicadores da "prudência" e do "realismo", os trabalhadores aprenderão que o verdadeiro êxito de uma luta não é o resultado imediato, que ainda que positivo estará sistematicamente ameaçado pelo aprofundamento da crise, e sim que a verdadeira vitória é a luta mesma, a organização, a solidariedade e a consciência que a luta desenvolve.
Assim sendo, contrariamente as lutas que se desenvolveram na grande crise do entre guerras e cuja inevitável derrota não produziu senão uma maior desmoralização e prostração, as lutas atuais são outras tantas etapas até a vitória final, e o desânimo momentâneo por derrotas parciais se transformará em sobressalto de raiva de determinação e de consciência, que fecundará as lutas futuras.
Ao agravar-se, a crise acaba por liquidar as poucas e irrisórias vantagens que a reconstrução permitiu repartir aos trabalhadores em troca de uma exploração cada dia mais sistemática e científica. À medida que vai se desenvolvendo, com o desemprego e o rebaixamento massivo dos salários reais, a crise empurra em uma miséria crescente um número cada vez maior de operários. Pelos sofrimentos que provoca, fica desnudado o caráter selvagem das relações de produção que aprisionam a sociedade. Porém, ao contrário das classes burguesas, pequeno burguesas e seus porta vozes que só vêem na crise uma calamidade e que a suportam com lamentos desesperados, os proletários devem saudá-la e reconhecer nesta, com entusiasmo, o ímpeto regenerador que varrerá os laços que os une ao velho mundo e que prepara as condições da sua emancipação.
A organização dos revolucionários
Seja de que tamanho ou intensidade das lutas levadas a cabo pela classe operária, só poderá chegar à emancipação se for capaz de dotar-se de uma das armas mais importantes e cuja carência lhe foi tão cara no seu passado: seu partido revolucionário.
É o lugar que ocupa no sistema o que faz que o proletariado seja a classe revolucionária. A decadência e a crise aguda do sistema criam as condições indispensáveis para sua atividade de classe. Porém, todas as experiências históricas ensinam que isso não basta se, ao mesmo tempo, a classe não consegue elevar-se a um nível suficiente de consciência e dotar-se do instrumento que é por sua vez produto e fator desse esforço: sua vanguarda comunista. Esta não é um produto mecânico da luta de classes. Se bem os combates presentes e futuros são o viveiro indispensável para o desenvolvimento da vanguarda, esta só poderá constituir-se e cumprir a sua tarefa se os revolucionários que a classe segrega tomam plena consciência das suas responsabilidades e se armam da vontade necessária para estar a sua altura. Em particular, as tarefas indispensáveis de reflexão teórica, de denúncia sistemática das mentiras da burguesia e de intervenção ativa na luta de classes não poderão ser levadas a cabo pelos revolucionários de hoje se não restabelecerem o laço político que, através do tempo e do espaço, tem sido a condição indispensável para sua atividade. Em outros termos, para cumprir a função que têm como produto da classe, os revolucionários devem apropriar-se do adquirido nas lutas e das correntes comunistas do passado, assim como devem reagrupar suas forças em escala da sua classe, em escala mundial.
Porém, os esforços dos revolucionários nessas duas direções encontram a dificuldade adicional devido à ruptura total da continuidade orgânica com as frações do passado. Por conta disso, o restabelecimento da indispensável continuidade política entre essas frações - que haviam recolhido e desenvolvido o essencial dos ensinamentos e da experiência passada da classe - e as correntes revolucionárias que a classe ressurgir, foi atrasado e entorpecido.
Nessas em particular, encontramos as maiores dificuldades para compreender duas coisas: sua função específica na classe e, sobretudo, o conjunto de problemas para os quais, precisamente, não dispõem de nenhuma experiência própria. Além do mais, a decomposição das camadas pequeno burguesas e a sua proletarização, que sempre foi um lastro para o movimento operário e que a decadência e a crise vêm acelerar e acentuar reforçam, ainda mais essas dificuldades. Em particular, os resíduos do "movimento estudantil", expressão típica da crise da pequena burguesia intelectual que teve seu auge quando a classe voltava a encontrar o caminho das suas lutas, têm semeado confusão na consciência das organizações revolucionárias. O culto da "novidade" e da "singularidade", da fraseologia, do indivíduo, da "desalienação" e inclusive do "espetáculo" (embora tanto se denunciava), esses cultos pois, tão próprios dessa variedade da pequena burguesia, com freqüência conseguiram transformar numerosos grupos que a classe havia feito surgir desde o seu reaparecimento, em seitas carcomidas por problemas mesquinhos e ambições pessoais .
De serem fatores positivos, esses grupos estão se tornando um obstáculo para o processo de tomada de consciência do proletariado; e se em nome de divergências inventadas ou secundárias, persistem na sua oposição a tarefa de reagrupamento das forças revolucionárias, o movimento da classe operária lhes fará desaparecer sem remédio.
Com meios ainda modestos, a CCI tem se consagrado à tarefa grandiosa e difícil do reagrupamento dos revolucionários em escala mundial em torno de um programa claro e coerente. Rechaçando o monolitismo das seitas, a Corrente Comunista Internacional faz um chamamento aos comunistas de todos os países para que tomem consciência das enormes responsabilidades que lhes incubem, abandonem as falsas querelas que se enfrentam, superem as divisões fictícias com que o velho mundo lhes abate. A CCI os chama a unir-se a esse esforço com o fim de constituir, antes dos combates decisivos, a organização internacional e unificada da vanguarda. Como fração mais consciente da classe operária, os comunistas deverão mostra-lhe o seu caminho, fazendo sua a consigna "REVOLUCIONÁRIOS DE TODOS OS PAÍSES, UNÍ-VOS".
Aos proletários
Proletários do mundo inteiro,
Os combates que têm participado são os mais importantes da história da humanidade. Sem eles, esta se dirigirá a um terceiro holocausto imperialista do qual não podemos prever mais que os horrores das suas conseqüências, que poderão significar para a humanidade um retorno há vários séculos ou milênios, ou uma degeneração que exclua toda esperança socialista ou a destruição total, pura e simples. Jamais houve uma classe que carregue tantas responsabilidades e tantas esperanças. Os sacrifícios que a classe operária suportou nas lutas passadas e talvez os mais terríveis ainda que a burguesia desesperada continuará impondo, não serão em vão.
A vitória da classe operária significará para o gênero humano a libertação definitiva dos grilhões que o submetem às leis cegas da economia e da natureza. Sinalizará o final da pré-história da humanidade, estabelecendo o princípio da verdadeira história e do domínio da liberdade sobre as ruínas do domínio da necessidade.
Proletários, para os grandes combates que os esperam, para preparar-nos para o assalto final contra o mundo capitalista, pela abolição da exploração, voltarmos a apropriar do antigo grito de guerra da vossa classe:
"PROLETÁRIOS DE TODOS
OS PAÍSES UNÍ-VOS".
Corrente Comunista Internacional, Janeiro de 1976.
[1]) Esta passagem faz evidentemente referência ao despertar do proletariado aos finais dos anos 1960 após meio século de contra-revolução. A discrição que dá das lutas operárias parece evidentemente desatualizada a respeito da situação atual. Na realidade, o desmoronamento dos países "socialistas" no final dos anos 1980 tem provocado um profundo retrocesso na consciência e na combatividade da classe operária. O peso desse retrocesso se manifesta ainda hoje através das dificuldades que tem o proletariado para desenvolver seus combates de classe e reencontrar o caminho de uma perspectiva revolucionária obstruída pela burguesia com sua sufocante campanha da «morte do comunismo» Entretanto, este retrocesso do proletariado não tem colocado em questão de maneira alguma o curso histórico do enfrentamento de classes aberto pela primeira onda de lutas em finais dos anos 1960. Apesar da lentidão do ritmo atual de recuperação das lutas, o futuro continua nas mãos do proletariado. É precisamente porque a luta de classes é um pesadelo permanente para a burguesia que esta lança incessantes campanhas ideológicas e manobras extremamente sofisticadas para impedir o gigante proletário de afirmar-se sobre a cena social.
[2]) Com o desaparecimento dos dois blocos imperialistas saídos dos acordos de Yalta (1945), o espectro de uma 3ª. Guerra Mundial havia se evaporado momentaneamente. Assim, embora o militarismo e a guerra caracterizem sempre o modo de vida do capitalismo decadente, a política imperialista de todos os estados, pequenos e grandes, se desencadeia em uma situação mundial dominada pelo caos e o cada um por si». Como o alistamento do proletariado dos países centrais para uma 3ª Guerra Mundial não está mais na ordem do dia, a alternativa histórica tem se modificado no sentido de Revolução Proletária ou destruição da humanidade na barbárie e no caos (ver o Manifesto do 9º Congresso da CCI em nosso site)
[3]) Embora em alguns países centrais - França, Áustria, Holanda - temos assistido a ascensão de frações de extrema direta, este fenômeno não é de maneira alguma comparável com o caráter que tomou nos anos 1920 e 1930 que permitiu a chegada ao poder do nazismo e do fascismo. A renovação dos partidos de extrema direita é essencialmente uma manifestação da decomposição do capitalismo, do "cada um na sua" que gangrena o aparato político do capitalismo. Porém não é a conseqüência de uma derrota histórica do proletariado como foi o caso nos anos que se seguiram a derrota da primeira onda revolucionária mundial de 1917-1923. Por outro lado, as campanhas antifascistas atuais não são comparáveis às campanhas de mobilização massivas do proletariado sob as bandeiras da democracia que permitiram o alistamento da classe para a 2ª Guerra Mundial.